domingo, 25 de novembro de 2007

Capítulo 12 - Revelarbus

Depois de descobrirem que a fada Bruxa era o objeto que deveriam procura, Kal, Guine, Ralph, Daimon e Jonathan foram aprovados em maldições e saíram cantarolando até o grande salão, onde lá esperariam até a hora do almoço.

Para surpresa deles ao chegarem no grande salão encontraram Adonis e Amanda Foster sentados a um canto com um pequeno bolo de aniversário com cobertura de glacê azul com treze velas brancas acesas.

- Papai, mamãe! – gritaram Kal e Daimon que em seguida correram para abraçar os pais, em seus calcanhares seguiu Guine no mesmo passo frenético e cheio de animosidade.

- Meus queridos, que saudade... – falou Amanda dando um amoroso beijo na testa de cada um dos três.

- Não vão apresentar seus amigos? – perguntou Adonis após dar um último abraço em Kal.

- A claro, estes aqui são Ralph e Jonathan. – apresentou-os Kal.

- Muito prazer, muito prazer. – disse Adonis erguendo a mão para os dois garotos a sua frente.

- É um prazer também, senhor Foster. – disse Ralph correspondendo ao gesto.

- Viemos aqui para comemorar com você, meu filho. Não podíamos deixar passar esta data.

- Obrigado, papai...

- Ah, nada que todos os pais não fariam por um filho.

Eles comemoraram e Adonis encantou confetes e serpentinas, o bolo feito por Amanda estava exatamente como Daimon definiu, um pedaço de nuvem caramelada, macio e saboroso. Assim que os primeiros alunos começaram a entrar no salão, Adonis e Amanda anunciaram sua partida dizendo que precisavam resolver uns assuntos na Cidade dos Elfos.

- Estamos hospedados na casa da Rainha Eva, vamos ficar lá esta semana, e na próxima iremos juntos para casa. – disse Adonis já muito ansioso.

- Tudo bem, pai, agora, poderia fazer estes enfeites sumirem. Porque os outros alunos estão olhando, e está ficando constrangedor... – falou Kal meio que sem graça coçando a nuca.

- Ah tenha certeza de que não queremos isto, tchau enfeites. – Adonis girou a varinha e num passa de mágica sumiram.

- Vamos bater uma foto para imortalizar o momento! – disse Amanda batendo palminhas.

- Mãe... todo mundo já está olhando...

- Sorria, Kalevi Foster! Adonis querido, a foto é só com os garotos... – disse Amanda ao ver que o marido se posicionava ao lado de Kal.

- Eu faço questão de sair na foto com, Kal, Daimon, Guinevere e seus amigos. Já ia me esquecendo, querem chapéus de aniversário? Eu trouxe alguns. – disse Adonis retirando do bolso um chapéu pontiagudo feito de papelão colorido.

- Não! – responderam os cinco.

- Fotograph! – os três flashes saíram da varinha de Amanda ofuscando a vista dos que estavam próximos da cena.

- Por favor, mamãe, chega... – disse Kal suplicante.

- Tudo bem, eu e seu pai já estamos atrasados.

- Fiquem bem, garotos!

Mesmo a alguns metros de distância Kal ouviu seu pai falar com Amanda que a foto ficaria melhor se todos estivessem usando os chapéus de aniversário.

- Seus pais são demais. – disse Ralph.

- Demais para a minha cabeça...

- Não resmungue tanto, Kal, eles são os pais perfeitos. – retrucou Ralph.

- Exceto pela overdose de carinho. – brincou Kalevi.

- Talvez os meus pais pudessem aprender um pouco com o de vocês.

- Nossa, Ralph, você fala de um jeito dos seus pais... Você é filho do Amadeus? – brincou Guine.

- Eu quis dizer que os meus pais não são atenciosos, e não monstros.

- Alguém ainda vai almoçar? – perguntou Kal.

- Eu não. – respondeu logo Guine.

- Jonathan e eu vamos subir e estudar para as outras avaliações. – disse Daimon levantando-se.

Os cinco saíram do grande salão e enquanto Daimon e Jonathan subiam as escadas, Kal, Guine e Ralph atravessavam a grande porta de carvalho que dava acesso aos jardins do castelo. Guine e Ralph sabiam que Kal havia ficado inquieto desde o momento em que a fada disse a eles que a ametista ganhada de Cacius estava no local em que Donnovan fora derrotado por Foster.

- E se for outra mentira daquela fada! – argumentou Guinevere.

- Por que outro motivo Cacius me daria esta pedra? Talvez ela me faça entender algo mais.

- Kal, não há mais o que ser entendido! Isto aconteceu há quase mil anos. Se algo diferente do que todo mundo sabe aconteceu, ninguém pode fazer nada. – falou Ralph.

- Eu sei, eu sei. Mas se Cacius quiser que eu veja? Com meus próprios olhos.

- Então tente! Vamos, tente ver alguma coisa. – motivou Guine.

Kal segurou a pedra entre os dedos e se concentrou no objeto. Imaginava a história que ouvira desde muito criança, que o seu antepassado destruiu um bruxo e todo seu exército das trevas. Ele começou a suar e sentir calafrios, os sons de pessoas conversando ruindo em sua cabeça, o som do vento tocando a grama... Todos esses barulhos misturavam-se em uma solução sonora enlouquecedora. A imaginação foi deixada para trás e em seu lugar veio angustia e aflição.

- Hurg! – exclamou soltando todo o ar dos pulmões – Não consigo!

- Acalme-se, nervoso você não vai conseguir nada, a não ser uma dor de cabeça. – disse Guinevere repousando a mão amigavelmente no ombro de Kal. Era incrível como ela se parecia com Amanda, talvez até mais que Kal e Daimon, a garota sabia animar e consolar qualquer um que precisasse, além de estar sempre presente para qualquer eventualidade.

- Obrigado... nossa próxima aula é de quem?

- Acho que é Biomagia. – informou Ralph – Não estou com a menor vontade de assistir aula mais... aquele teste do Amadeus pegou todo mundo de surpresa.

- Se Daimon não prestasse tanta atenção nas aulas provavelmente ainda estaríamos lá.

- Não duvido disto, Kal. Meninos, agora vamos subir para a aula, não podemos nos atrasar.

No caminho até a sala da professora Flora, Kal lembrou-se da carta dos pais de Ralph e da aparência horrenda de Kricolas. A mistura de humano e vampiro não fizera bem a ele, era a criatura mais pavorosa que já vira. No entanto, um pensamento novo surgiu em sua cabeça.

- Como Donnovan era?

- O que foi, Kal? – perguntou Ralph – parece que ouvi você dizer algo.

- Estava pensando como era Donnovan. – respondeu.

- E porque a curiosidade agora? Você não corre o risco de encontrá-lo em qualquer esquina.

- Tenho certeza que não, Ralph, mas é intrigante...

- Não acho intrigante ver o rosto de um assassino milenar. Já basta um louco a solta. – disse.

- Já faz tanto tempo que ele fugiu, e não se mostrou mais depois de alguns homicídios no início do ano.

- Talvez tenha morrido. – sugeriu Guine e Kal pode sentir a esperança da garota ocupar todo o corredor onde estavam.

- Ele é um vampiro Guine... – disse Kal expulsando a esperança.

- Quem sabe foi tentar pegar um bronzeado em Copacabana e acabou virando fumaça. – disse ela trazendo novamente a esperança.

- Ele também é um bruxo... – disse o outro a empurrando para fora mais uma vez.

- Então quem sabe ele desistiu de tudo e está morando em uma ilha no pacífico e...

- Chega de suposições, Ok? Agora, vamos para a aula.

Finalmente na sala de Biomagia, os três acomodaram-se em lugares onde mal se via a professora.

Na aula daquele dia Flora traduziu para os alunos alguns livros de feiticeiros antigos, em seus herbários, tipo de livro onde se cataloga espécies vegetais, a professora explicou que eles colocavam apelidos em determinadas plantas para que humanos mal intencionados não pudessem se aproveitar de suas poções.

- Exemplo, uma asa de morcego na verdade era uma folha de louro, olhos do diabo eram um tipo de castanha vermelha, patinhas de aranha tratavam-se apenas de canela. – explicou a professora.

Já na aula de Relações com a Natureza, com a turma de Katzin, a professora iniciou uma chata explicação sobre a importância de uma planta chamada Vitória-régia, segundo Margarida, uma mulher apaixonada pela lua atirou-se no rio atrás do seu amado, que na verdade era um reflexo da luz lunar, e...

- Coitadinha... transformou-se num vegetal... – comentou – suas pétalas ainda hoje são utilizadas para preparos de poção do amor.

Rick Wosky não parecia dar atenção à história de uma mulher que se transformou em planta, pois passou a aula inteira cochichando com um pequeno grupo de alunos de Katzin, mas foi repreendido pela professora um pouco antes do sino anunciar o fim da aula.

- Pode parecer uma surpresa para você, senhor Wosky, mas a matéria que leciono, por mais desinteressante que possa lhe parecer, ainda conta pontos para o seu boletim!

Depois das duas terríveis aulas com os alunos de Katzin, eles seguiram para uma segunda e dolorosa aula de Biomagia. E a palavra que descreveu a aula era realmente essa, dolorosa. Os alunos estavam em um nível avançado de contato com suas plantas, que já começavam a ficar irritadas.

A Fantara d’ouro de Ralph lhe provocou algumas queimaduras na mão quando ele tentou coletar uma pétala para preparar uma poção.

- Use as luvas de couro de dragão. – berrou a professora em seguida – E você, Andrade, não aperte tanto o caule de sua planta ou ela vai...

Não dera tempo de terminar o aviso e Pedro Andrade foi mordido por sua planta carnívora e seus ossos ficaram expostos.

- Alguém leve este pateta para a enfermaria... – sibilou a professora.

- Alguém coloque a cabeça de Rick na boca daquela planta. – cochichou Kal a Guine e Ralph.

- Eu ouvi isso, Foster! – falou novamente a professora muito zangada.

Com o fim de toda aquela tormenta, os alunos de Tadewi caminharam até o quinto andar para assistirem a última aula do dia. Na primeira aula, Cacius iniciara uma revisão sobre Merlin, Donnovan, Foster e Kricolas, embora todos concordassem que esta revisão era desnecessária, já que todos os bruxos do Brasil conheciam a história de cor. No entanto, o que despertara a atenção geral fora Cacius dizer que contaria um pouco mais sobre a vida de Kricolas.

- Olá novamente, alunos! – saudou o diretor ao entrar na sala com seus costumeiro atraso de cinco minutos – Continuaremos com a Revolução dos Duendes de 1432, não é?

- Na verdade, professor, iríamos falar sobre Kricolas. – corrigiu Pedro.

- Oh, sim. Obrigado por lembrar esta cabeça velha, senhor Andrade.

Cacius não parecia nada convincente em seu papel de caduco, na opinião de Kal.

- Muito bem, vamos partir das origens então. Kricolas nasceu no mesmo período que Foster. Era filho de um vampiro com uma bruxa, Kricolas já nasceu poderoso, cresceu e ficou ainda mais. Diferente dos outros vampiros, ele podia andar naturalmente sob a luz do sol, e diferentemente dos outros bruxos, ele possuía grande força física e imortalidade. Foi um grande achado para Donnovan...

- E o que Kricolas ganharia ajudando Donnovan? – perguntou Camila Cerda após levantar a mão.

- Certo, Kricolas era uma aberração aos olhos dos outros, nem vampiros, nem bruxos o aceitavam. – Cacius parou por um segundo e deu uma piscadela para Kal – Ao lado de Donnovan, Kricolas seria finalmente reconhecido pelo seu grande talento, não importando a aparência que tivesse. Enquanto ficasse ao lado do Cavaleiro Negro, ele seria respeitado e aceito dentro de qualquer grupo.

- Professor! – interrompeu Guine.

- Sim.

- Se Donnovan era tão contraditório quanto a mistura de raças, por que admitiu Kricolas?

- Donnovan não aceitava a condição não mágica de alguns humanos, e não a mistura de raças. Os que não eram portadores de nenhum talento em especial eram dignos de viver, é o que ele pensava. E aos seus olhos, Kricolas era um ser quase perfeito. Forte e imortal.

- Por que quase perfeito? – agora quem interrompia era Ralph.

- Porque Kricolas não gozava de muita beleza. Era realmente horrendo. Mesmo assim se tornou o braço direito de Donnovan.

- Se ele era mesmo o maior soldado de Donnovan, por que não esteve no dia em que o exército foi derrotado, por, bem... quando foi derrotado. – disse Kal embaraçado por não querer chamar atenção.

- Não tenho dúvidas de que ele esteve lá. Não tenho dúvidas. Mas não permaneceu por muito tempo. E depois que se viu sozinho, fugiu e ficou desaparecido por muitos anos. Até que finalmente foi apanhado pela Guarda de Warren.

- E o que ele fez enquanto esteve livre? – indagou Kal muito curioso e com medo de ouvir uma determinada resposta.

- O mesmo que ele deve estar fazendo desde que fugiu de Warren. – respondeu Cacius tenebrosamente.

- Tentando trazer Donnovan de volta. – arriscou Kal, e os outros alunos prenderam a respiração a espera de um pronunciamento mais claro da parte de Cacius. Mas o professor, pelo menos naquele momento, calou-se e consentiu.

O final de semana havia chegado e todos os alunos tinham tempo livre para passearem pela Cidade dos Elfos, seja tomando sorvetes ou saboreando doces na Suor de Sapo, o mais popular ponto de encontro entre os estudantes. Alguns dos alunos mais aplicados passavam os dias de sábado e domingo lendo alguns livros na biblioteca da loja Livros & Boatos, o lugar preferido de Daimon, e também da maioria dos outros alunos de Angus. Kal, Ralph e Guinevere preferiam sentar-se na pequena praça no centro da cidade a espera de Adonis e Amanda que estavam pousados na casa da Rainha Eva. Os dois enviaram a Kal um recado, na noite anterior, para que ele os esperasse naquele mesmo lugar àquela hora.

- Estão demorando... – queixou-se Guine.

- Hei, olhem os Wosky! Não parecem a família perfeita?

Kal acabara de avistar Rick e seu pai saindo de uma pequena lojinha com janelas de vidro e uma portinha como as de faroeste. Rick saiu às pressas da loja como se estivesse prestes a explodir de tanto ódio. Não foi difícil perceber o motivo. Ao que parecia, Amadeus forçara o filho a cortar os longos cabelos que já desciam a altura do ombro. De onde estavam puderam ver nos lábios de Rick uma enorme indignação dizendo algo, como, “ele me paga”.

- Vocês estão aí! – Adonis e Amanda haviam acabado de chegar – E onde está o seu irmão?

- Deve estar na livraria, como sempre, pai.

- Olá, senhor e senhora Foster. – cumprimentou Ralph.

- Olá, como vai? – retribuiu Amanda procurando ser o mais atenciosa possível.

- Semana que vem vocês entrarão de férias! Júlio os levará para casa, meus queridos. Se quiser passar as férias conosco será bem vindo, Ralph.

- Obrigado, Sr. Foster. – disse Ralph muito alegre, aparentemente, seus pais não pareciam ficar em casa durante as férias de julho porque Ralph de imediato aceitou o convite.

- Amanda de eu tínhamos planejado passar o final de semana inteiro com vocês, mas soubemos que Thom piorou...

- Como assim piorou? – perguntou Kal.

- Bem, desde aquele dia na cripta ele tem estado no Hospital Nautilus, e... desta vez ele ficou inconsciente. Ninguém sabe porque isto está acontecendo, lógico ele é um vampiro, não deveria ficar doente, e isto não é normal.

- Ah... tudo bem então. Entendemos. – disse Guine desapontada.

Amanda e Adonis deram um abraço de despedida nos três, Adonis confirmou o convite com Ralph, em seguida esfumaçaram dizendo que iriam dar uma passada rápida na Livros & Boatos para despedirem-se de Daimon.

- Sempre Thom, sempre ele... – bufou Kal lembrando-se que fora ele, também, o motivo de terem caminhado até a Cidade do Norte, sozinhos, ele, Daimon e Guinevere.

- Acalme-se, Kal, ele está doente... – disse a garota colocando a mão por sobre o ombro do amigo.

- Olhe o lado bom, o vampiro que os seus pais “correm” atrás está doente e prestes e morrer, se é que posso dizer isso. Mas o vampiro que os meus pais procuram está bem vivo e matando pessoas!

- Não precisa ser tão grosso, Ralph. – falou Guinevere.

- Não estou sendo grosso...

- Pessoal. – falou Kal tranqüilamente – Vamos procurar algum lugar para esfriarmos a cabeça...

- Podemos ir para a Suor de Sapo, soube que eles têm refrescos ótimos. - sugeriu Ralph inutilmente.

- Um lugar onde não tenha ninguém. – falou Guine que parecia ler os pensamentos de Kal com seus tão esverdeados olhos.

Os três caminharam silenciosamente passando pelas repúblicas, pela loja que vendia quites de poções e por vários outros alunos que vinham das mais variadas direções, menos uma.

- Vamos para a loja Mausoléu! – falou Kal com o dedo erguido – Ninguém nunca vai lá, e, posso contar uma coisa para vocês.

Atravessar toda a cidade e caminhar mais um pouco não é a idéia de um fim de semana perfeito para um aluno de Avalon, mas lá estavam os três, finalmente alcançando o destino.

- Será que tem alguém? – perguntou Ralph olhando pela janela de vidro quebrada – Até parece que fecharam a loja.

- Vamos entrar para descobrir. – disse então Kal.

A velha loja continuava tão gasta e mofada quanto antes, com seus velhos móveis de madeira rústica, algumas caixas de papelão empilhadas perto das paredes, o velho balcão estava coberto por uma grossa camada de poeira, confirmando suas suspeitas de que o local fora abandonado por sua dona, que no início do ano vendeu para Kal e Daimon dois caldeirões.

- Estamos aqui. O que tem para nos contar, Kal?

- Calma Guine, vamos sentar primeiro. – disse procurando um lugar confortável. – muito bem, é sobre uma conversar que eu tive com o Prof. Tirso esta semana.

- E o que vocês conversaram? – perguntou Ralph enquanto se ajeitava num banco velho de madeira com apenas três pernas.

- Acontece que, mesmo não acreditando muito na existência do Livro de Merlin, existem bruxos o procurando! Eles querem encontrar o livro. Entendem?

Guine e Ralph balançaram a cabeça positivamente indicando que estava tudo certo.

- Eles estão preocupados. Preocupados com o que pode acontecer se Kricolas botar as mãos no livro. – deduziu Ralph.

- E o que pode acontecer? – perguntou Guinevere olhando fixamente nos olhos de Kal.

- Kricolas vence o jogo. E o prêmio é uma viagem da morte para a vida. Do esquecimento à aparição. Donnovan retorna ao nosso mundo, para pesadelo da maioria e delírio de alguns.

- Como? Não deve nem existir o pó dele. – falou Guinevere reafirmando seu ceticismo.

- Guinevere! Acorde! Preste atenção! É o Livro de Merlin nas mãos de Kricolas!

- E quem garante que este livro existe de fato, Kal? E se existir e ele não passar de um livro de receita de bolo?

- Cacius acredita! Tirso acredita, meu pai acredita! – enfatizou Kal sabendo que para Guinevere a opinião de Adonis contava muito.

- Tudo bem. Vamos supor, e apenas supor, que o Livro de Merlin exista e que seja super poderoso e que contenha os mais incríveis feitiços do mundo. Supondo tudo isso, o que nós podemos fazer?

- Eu sei que não há nada que possamos fazer. Não podemos chegar para Kricolas e dizer, “oi senhor, não vamos deixar você levar o livro, ok” – falou Kal com sarcasmo – mas precisamos convencer todo mundo, porque o governo está se omitindo, limitando-se a procurar por Kricolas!

- Eu penso diferente. – disse Ralph pela primeira vez desde que chegaram – Não podemos esperar Kricolas achar o livro! Vamos encontrá-lo primeiro.

Ralph parecia firme em sua colocação. O que era raro em acontecer. Geralmente ele se apoiava nas decisões de Kal ou Guine, mas agora fora diferente. Talvez ele estivesse se enquadrando perfeitamente com os ideais de Tadewi. Que aceitava alunos com vontade e poder de mudar os caminhos.

- Você só pode estar brincando Ralph...

- Certamente que não. Podemos encontrá-lo, Guine.

- E você pode me dizer como?

- Vamos pesquisar. Você e eu procuramos na biblioteca da escola e Kal pode procurar na biblioteca do Conselho Estudantil.

- Não acredito que vocês me convenceram... – falou a garota com a cabeça abaixada – Mas se vamos procurar, é melhor perguntar ao Daimon primeiro!

Guinevere estava coberta de razão. Se havia um aluno em Avalon que sabia de cór cada linha de cada livro da biblioteca, este aluno era Daimon. Suas horas livres e finais de semana eram dedicados a demoradas leituras que podiam se estender do sábado de manhã até à noite do domingo. O primeiro passo a ser dado então, era procurá-lo. Se Daimon não pudesse ajudá-los teriam que fazer uma busca minuciosa no acervo das bibliotecas.

- Daimon! – gritaram os três, finalmente depois de quase duas horas de busca.

- Oi! – cumprimentou.

- Queremos que você nos diga onde podemos encontrar o Livro de Merlin. – disse Kal e os outros dois atrás dele encararam Daimon com apreensão.

- Claro! – respondeu – Em quase todos os livros da biblioteca.

- Han? – espantaram-se.

- A maioria dos livros de história e feitiços fala sobre o Livro de Merlin, em geral o relatam como sendo uma lenda, mas ainda assim comentam.

- Como assim? – questionou Guinevere.

- Estou dizendo que basta você abrir qualquer livro de história que o índice trará algumas afirmações sobre ele. Com exceção do livro de Cacius “Caminhos do tempo”, não traz nada. Talvez ele não queira mostrar seu próprio ponto de vista, ou talvez ele não tenha um ponto de vista, mas eu acho que ele tem, sendo quem é. Cacius o todo poderoso. Dizem que ele é quase um oráculo sabem, vê tudo, sabe de tudo. E nem pergunta nada a ninguém. Como se tivesse olhos de águia, audição canina... não que falcões enxerguem mal, Ralph, mas é que dizer olhos de águia dá ênfase à frase, sabe como é...

- Cale a boca Daimon! – repreendeu Kal ao irmão que não parecia mais controlar o impulso de ficar falando – Agora, com uma resposta curta, onde, qual a localização do Livro de Merlin segundo os livros da biblioteca.

- Isto depende de quem escreveu o livro. Todo bruxo defende a hipótese de que o livro está no seu próprio país.

- Não há localização precisa?

- Na Inglaterra o livro está enterrado em Stonehenge, no Egito está sob a pata dianteira esquerda da Esfinge, no Japão ele está embaixo do monte Fuji. Na China ele está no meio da muralha e na Itália ele está escorando a Torre Piza...

- Já entendemos Daimon, já entendemos... – disse Ralph pedindo calma com as mãos.

- E no Brasil? Onde supostamente está o livro? – indagou Guinevere muito interessada.

- Esta é a melhor parte. Todos os livros brasileiros de história, com exceção o de Cacius, afirma que o Livro de Merlin está debaixo dos nossos narizes. Aqui, na Cidade dos Elfos! – respondeu ele de modo conclusivo.

- Na Cidade dos Elfos? – disseram os outros três ao mesmo tempo calando-se quando perceberam que já estavam chamando atenção.

- Isso é o mais estranho. Porque não tem um ponto em específico como nos demais paises.

- Tirso procurou, quer dizer, acho que estava procurando o livro por aqui... – deduziu Kal, mas foi interrompido por uma voz terrivelmente penetrante.

- Preparando outro motim, Foster? – Amadeus acabara de surgir com o seu ar fedido e pesado.

- Como assim motim? – perguntou Kal.

- Soube o que você fez com um aluno de Katzin e informei ao presidente do conselho.

- Só pode estar falando do babaca do seu filho! – encarou Kal, mas no segundo seguinte percebeu que fora um erro.

- Deveria agradecer por você não ser meu filho! Saberia muito bem o que fazer com esta sua petulância! O ano ainda não acabou, Kalevi Foster... – disse Amadeus fuxicando o nariz empinado e girando nos calcanhares seguiu adiante até entrar na Suor de Sapo.

Kal sentiu sua espinha esfriar como se Amadeus soprasse gelo. Uma forte dor incômoda lhe desceu pelo estômago arrancando-lhe um soluço.

- Você está louco? – berrou Guinevere – Ele é seu professor! Deu sorte por não levar uma suspensão!

- Melhor. Assim teria mais tempo para procurar pelo Livro de Merlin.

Na noite de domingo, Kal foi deitar-se anormalmente cedo. O dormitório que dividia com Ralph e Pedro estava vazio e silencioso. Era uma hora perfeita para fazer a projeção astral, mas Kal não quisera. Pretendia permanecer ali, descansando e preparando-se para a semana final e para as provas. Tudo era muito exaustante, provas, reuniões no conselho, mais provas..., a adorável família Wosky...

Continuando a pensar em coisa ruim, Kal levou seu pensamento até Donnovan. A curiosidade o aguçava saber como era o rosto daquele bruxo. Uma preocupação fútil, mas que não lhe fugia da cabeça. Começou a brincar com a imaginação, criando sua própria idéia de Donnovan. Feio, olhos esbugalhados, nariz anormalmente grande e torto, pele seca e enrugada, queixo fino, dentes muito grandes. Ninguém pode ser tão feio, pensou Kal lembrando-se que apesar de tudo ele era uma pessoa como outra qualquer, e não um resultado de mistura de raças tão diferentes como fora Kricolas.

Colocou então barbas longas e prateadas, cabelos desgrenhados e com tranças, olhos azuis. Vira então Cacius. Lembrando-se do professor, tirou debaixo do travesseiro a ametista e passou a encará-la com cuidado.

Viu-se sendo refletido e começou a girar a pedra nas próprias mãos, mesmo assim sua pequena imagem continuava ali, apenas alterando de forma de acordo com o relevo da pedra. Alguns minutos se passaram e ele continuou ali, estático, olhando-se. Mas a imagem então sumiu e a pedra ficou branca, como ficou em seguida tudo ao seu redor.

Kal levantou-se depressa. Viu que estava de pijama em uma trilha de terra batida e ao longe viu um homem esfumaçar e caminhar rumo a sua direção.

- Onde estamos? Quem é você? – perguntou ao homem que não parecia ouvi-lo.

Ele era razoavelmente alto, olhos tão azuis quanto o céu acima deles, cabelos acaju e bem lisos cobrindo-lhe as orelhas e uma franja muito bem desenhada em sua testa. O pescoço fino e comprido ostentava o rosto de uma pessoa decidida. Tinha as feições leves, nariz fino e delineado e uma boca rosada.

Quando o homem misterioso passou por Kal, com sua capa, tudo ficou branco novamente e ele agora estava de pé à frente de um outro homem. Forte e também decidido. Usava uma roupa negra assim como o cabelo e os olhos, tinha um sorriso maldoso e pouco convincente. Ele ergueu a varinha cor de ébano e gritou para o primeiro homem que estava a uns quinze metros.

- Veio assistir ao meu triunfo, Foster?

Um grande flash varreu toda a cabeça de Kal e ele percebeu o que estava acontecendo. Estava em uma visão do passado. No exato dia em que Foster vencera Donnovan, que supostamente, era o homem ao lado de Kal. Sua curiosidade fora saciada. Agora sabia que Donnovan era pálido e que tinha cabelos e olhos negros, nariz fino e testa curta. Era ele, o Cavaleiro Donnovan. E mais à frente o seu primeiro ancestral, Foster, que parecia ter saído de um briga, pois estava com um dos cantos da boca sangrando e a roupa suja de terra, além do suor escorrendo-lhe pelo rosto.

Um outro segundo se passou e um vasto exército de tantos outros bruxos surgiu atrás dele e de Donnovan... Afastando-se ao máximo, Kal depara-se com a monstruosa presença de Kricolas. Ele era realmente fora do comum.

- Quer que eu acabe com ele, mestre? – perguntou a Donnovan que em seguida consentiu com um breve acenar de cabeça.

- Perpétuo! – berrou Foster com toda a suas forças e a varinha erguida na direção de Donnovan e o exército.

Imediatamente, o Cavaleiro Negro agarrou Kricolas por um dos braços e o transformou em fumaça. Ao que parecia, ele fora transportado por seu mestre. O peito de Foster começou a brilhar intensamente. A luz emanou uma forte energia que passou a varrer todo o lugar. Donnovan gritava assim como todo o seu exército. Muitos deles tentaram esfumaçar, mas logo voltavam ao mesmo lugar. Estavam presos em um tipo de campo de força mágico.

Um forte vento soprou da direção de Foster, o que provocou uma pequena tempestade de areia, algumas pedras também foram carregadas pelo vento e uma delas voou na direção de Kal. Era uma ametista, e ele soube que era exatamente a sua. Ela aproximou-se do garoto com um estranho e forte brilho, antes mesmo que ela pudesse toca-lo, Kal obrigou-se a fechar os olhos e a partir de então perdeu a consciência. Segundos mais tarde, ele recuperou o foco da visão e olhou para as camas de seus dois companheiros de quarto, que já dormiam. Fez o mesmo.

Logo no café da manhã, Kal contou a Ralph e Guine os detalhes da visão que tivera na noite anterior. Os dois responderam com demorados “oh”, “minha nossa”, “pelas barbas de Merlin”... era tudo tão intenso e emocionante que continuaram falando sobre o assunto até chegarem ao castelo.

A primeira aula de Poções foi uma rapidíssima revisão geral para a prova de quarta-feira. Em Relações com a Natureza eles não tiveram a mesma sorte. A professora fez questão de passar o último assunto do semestre, algo sobre fotoperiodismo.

Como as aulas de Maldições já haviam acabado para os alunos que passaram no primeiro teste e Cacius tivera um problema em seu escritório, Tirso aproveitou a oportunidade para repassar seu último conteúdo antes das férias. Ele teve que ouvir alguns lamentos exaustos, até mesmo de Kal, mas finalmente convenceu os alunos com uma boa explicação do que seria a aula.

- Quero e preciso mostrar a vocês, alunos. – ele havia reunido as três turmas, Angus, Katzin e Tadewi, numa mesma aula em uma sala maior que a sua – Um feitiço nada poderoso, mas muito revelador. Ele poderá mostrar o caminho certo a ser seguido se vocês puderem compreendê-lo. Poderá ser de grande ajuda, quem sabe. Mas o mais importante é que todos vocês pensem no que irá acontecer aqui hoje. Vocês terão o mês de julho para refletirem sobre o Enid de cada um.

- Professor, o que é um Enid? – perguntou Kal e Daimon escondeu o rosto com as mãos como se estivesse envergonhado pelo irmão ter feito aquela pergunta.

- Enid, Kal, é a alma mágica de um bruxo. – explicou o professor – É a fonte de nossos poderes. É o que nos diferencia dos outros seres humanos. Quem não tem Enid, não tem dons mágicos.

- E como recebemos este Enid? – perguntou Kal novamente, Daimon apenas desejou ser um avestruz.

- Quando um bruxo nasce, ele recebe um Enid, um que já pertenceu a outro bruxo que morreu. É a presença do Enid que não nos deixa chorar quando nascemos. Alguns outros bruxos desenvolvem um próprio, estes bruxos tornam-se poderosos. Exemplos de bruxos com Enid próprio, quem poderia?

- Merlin, Foster e Donnovan. – respondeu Daimon de imediato tentando resgatar o orgulho ferido da família.

- Correto. Estes três bruxos nasceram com Enids próprios, quer dizer, Merlin tinha como Enid ele mesmo. Por isso era tão poderoso.

- E como um Enid nos escolhe? – perguntou desta vez uma aluna de Katzin.

- Ele escolhe o bruxo que tenha características bem semelhantes às dele. Por exemplo, o professor Cacius detém o Enid de Merlin! – vários alunos suspiraram outros agiram como se não fosse novidade – Agora, vou ensinar-lhes como descobrir seu Enid usando um feitiço chamado Revelarbus.

Tirso conjurou o feitiço no meio do círculo em que os alunos haviam se disposto e de sua varinha partiu um filete dourado que caiu no chão transformando-se em fumaça e revelou então um velhote com pouco mais do que um metro e sessenta, careca, olhos finos e joelhos ossudos.

- Meu tio avó, Zacarias. – apresentou Tirso – Meu Enid. Quem quer ser o próximo?

Ele começou a chamar aluno por aluno, começando pelos de Angus. Todos se saiam bem sucedidos com o feitiço, até o momento todos os alunos haviam reconhecido seu Enid como sendo um membro da família, até mesmo Daimon, que descobriu ter o Enid do bisavô Epaminondas Foster III.

- Revelarbus! – disse uma garota de Angus e um homem moreno e de terno verde apareceu a sua frente.

- O Reconhece, Ligia? – perguntou Tirso ao que a garota disse não, e o professor continuou – Alguns bruxos recebem Enid de pessoas sem nenhum tipo de laço sanguíneo. Lócus Amenus! – disse Tirso apontando para o Enid no centro da sala e este desapareceu.

Aos poucos todos foram sendo chamados, quando chegou a vez de Wosky, ele se apresentou aparentemente orgulhoso de si e pomposamente disse:

- Revelarbus! – uma fumaça prateada vazou de sua varinha e ilustrou o ar a sua frente com uma imagem amedrontadora. Um homem de capuz preto até os calcanhares, mal se via seu corpo escondido atrás de todo aquele pano, e por ele emanava uma fumaça gelada e arrepiante.

- Lócus Amenus! – falou o professor percebendo a cara de pavor nos alunos, desta vez não ousou perguntar quem era aquele bruxo e Wosky retornou ao lugar muito satisfeito.

Guinevere foi a primeira aluna de Tadewi a se apresentar. Seu Enid era, para espanto geral, uma criança. Uma pequena menininha de uns quatro anos. Ralph foi chamado logo em seguida e de sua varinha surgiu uma mulher alta e de corpo bem delineado, cabelos negros e olhos claros. Ela olhava de aluno para aluno como se procurasse algo, então encontrou Ralph, parou e sorriu.

- Sabem quem é ela, alunos? – perguntou Tirso, mas nem mesmo Ralph soube responder – Nefertiti. É um Enid milenar. Sabe-se que pertenceu a Morgana Lê Fay.

Todos olharam para Ralph admirados, Kal e Guine deram sorrisinhos e ele retornou ao lugar num tom de quase roxo.

- Vamos continuar... – prosseguiu Tirso.

- Hei, Kal! Quem você acha que pode ser o seu Enid? – perguntou Daimon silenciosamente para não serem ouvidos.

- Eu nem sei se tenho mesmo um. – respondeu.

- Não seja tolo! É claro que tem. Ainda posso apostar com você que é um Enid próprio.

- Por que, Daimon? – perguntou Ralph.

- Kal não nasceu bruxo! – respondeu – Ele desenvolveu habilidades mágicas quando tinha seis anos. Isso teve repercussão! Seus pais talvez se lembrem do Milagre Foster.

- Quer dizer que Kal pode ter um Enid próprio? Tê-lo desenvolvido quando tinha seis anos... – mentalizou Ralph como se fosse a coisa mais difícil de se entender.

- Kal Foster! – chamou Tirso.

Ele nem se dera conta de que já era o último aluno a ser chamado, todos o encaravam curiosos e ele passou a ficar mais nervoso. Os pouco mais de cinco segundos que o separavam do seu lugar ao centro da sala foram longos demais em sua cabeça, que passou a imaginar-se ali no meio da sala, na frente de todos, dizendo o feitiço, mas sem produzir qualquer efeito. Não sair nem uma fumacinha pra dizer que o Enid dele é o de uma ameba. Imaginou sua varinha ganhar vida e saltar de sua mão correndo para a de Wosky, dizendo que ele sim era um bruxo de verdade.

- Está pronto, Kal? – perguntou Tirso que assim como os outros parecia curioso para saber que tipo de Enid o Milagre Foster desenvolvera.

- Ah... ah... claro professor. Revelarbus!

De repente, toda a sua imaginação esvaiu-se. Sentiu um vento forte passar-lhe pela nuca, girar em torno de sua cabeça e descer pelo braço que segurava a varinha. Uma fumaça negra e densa se formou a sua frente dando lugar em seguida a um homem alto e robusto, rosto pálido contrastando com os olhos negros e frios. Tinha um sorriso maldoso e debochado.

- Lócus Amenus! – apressou-se em dizer Tirso percebendo o que estava acontecendo.

Alguns alunos haviam se afastado muito nervosos, enquanto outros tentavam entender o que estava acontecendo.

- Kal, acompanhe-me até a diretoria.

Tirso puxara-o pelo braço abrindo caminho pela multidão de alunos. Saíram da sala rapidamente e Kal ainda pensava no que acontecera.

Como pode isto? Meu Enid ser Donnovan.

Um comentário:

Anônimo disse...

Cara! Esse foi o,melho cap. até agora! Eu também quero um Enid...