terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Capítulo 7 - O Vale Cratera

Kal sentiu um forte arrepio na espinha ao ouvir as últimas palavras do senhor Timas. Seu estômago revirou de uma forma que ele achou que acertaria as pessoas lá em baixo com sua última refeição.

Um dos bruxos de capa preta que acompanhava Saguior conjurou uma cadeira ao lado do palanque e ordenou que ele se sentasse. Relutantemente, o fauno movimentou seus cascos de bode pelo chão de pedra da sala do conselho e largou-se em cima da cadeira.

Timas olhou para Saguior, ao seu lado, fazendo questão de conferir de perto se as mãos dele estavam devidamente bloqueadas por aquelas duas bolas de energia. Após esse checape, o ministro da Comunicação Mágica olhou para os membros do conselho e os visitantes, alertando-os.

- Qualquer intromissão neste julgamento implicará na remoção imediata do indivíduo.

Uma pequena balbúrdia se seguiu após a fala do ministro que teve que disfarçar um pigarro para chamar a atenção de todos para o palanque.

- Como previsto em sorteio, anteriormente realizado com representantes da defesa e da acusação, ficou estabelecido que este julgamento se iniciará com uma alto-defesa do réu. – disse Timas em voz solene – Por favor, fauno, aproxime-se.

Timas desocupou o palanque e permitiu que Saguior o usasse em sua defesa.

- Eu cumprimentaria cada um de vocês aqui hoje, mas como podem ver... – disse mostrando as mãos bloqueadas, pequenos risos surgiram da platéia – O que posso dizer em minha defesa é que sou inocente. Apenas isso. Por anos eu protegi a Caixa de Pandora com todas as minhas energias, fiz o possível para mantê-la em sigilo. E consegui, por um bom tempo. Ninguém desta época sabia de seu paradeiro e todos continuariam na ignorância se não fosse pelos conhecimentos milenares de Kricolas. Ele era a única pessoa viva que sabia que eu guardava a caixa.

Um pensamento estranho passou pela mente de Kal deixando-o curioso. Saguior é tão velho quanto Kricolas?

- Um homem me confiou a Caixa de Pandora e me fez prometer que jamais a abriria ou permitiria que ela caísse em mãos erradas. Eu era o guardião da caixa e jamais permitiria que ela fosse tirada de mim, como está sendo dito neste tribunal. É isso que tenho a declarar.

Saguior afastou-se do palanque e sentou-se novamente em sua cadeira de réu. Timas também retomou seu lugar.

- Bem, seguindo o sorteio, temos a voz da acusação.

Dorian Gulemarc esgueirou seu corpo esquelético pela mesa, pedindo licença às pessoas para que pudesse passar com o merecido conforto. Kal sentiu imenso asco ao olhar aquela figura desprezível, com seu imenso nariz que quase lhe tomava o lugar da boca e dos olhos.

- Saguior disse que Kricolas sabia onde estava a Caixa de Pandora, mas ninguém conhecia seu paradeiro a não ser ele mesmo, o guardião. Responda-me, como ele poderia saber, bode velho? – disse Dorian quase que se deleitando por poder insultar Saguior em público sem ser repreendido, afinal, os bruxos do alto escalão tinham essa “licença” especial.

- Você já disse tudo o que precisava ouvir. Sou um bode velho. – respondeu Saguior.

- Vocês vêem? – disse Dorian olhando para os presentes, enquanto apontava o fauno – É assim que ele se porta perante um conselho sério.

- Não me venha falar de seriedade, Dorian.

- MINISTRO, PARA VOCÊ! – exclamou com veemência.

Kal sabia que Saguior não estava se ajudando.

- Vamos, bode, diga-nos quem lhe deu a caixa? Quem seria louco o suficiente para deixar um objeto tão poderoso nas mãos de alguém tão... indigno.

Saguior baixou o rosto, Kal podia sentir a fúria que ele emanava.

- Não vai dizer? Kricolas também roubou sua língua? – alguns bruxos riram do comentário.

- Essa informação não interessa ao conselho. – retorquiu Saguior.

- Não interessa? O que acha que viemos fazer aqui, então? Jogar Quizard? – outra onda de risadas seguiram-se ao Dorian mencionar o esporte dos bruxos – Nós determinamos o que é e o que não é importante neste julgamento. Você, criatura, apenas responde.

Saguior não prestava mais atenção em Dorian ou nas risadas de deboche da platéia. Mantinha um olhar fixo na direção de Cacius, que o correspondia. Os dois estavam compenetrados, como se um estivesse na mente do outro. Percebendo o contato, Dorian postou-se entre os dois e eles se dispersaram.

- Você disse que ninguém desta época poderia saber que você era o guardião da Caixa de Pandora. Disse também que Kricolas sabia por possuir um conhecimento milenar. E finalizou quando disse que de fato era um bode velho. Está insinuando que é tão velho quanto Kricolas?

- Pense o que quiser. Sua opinião não me interessa em nada. – rebateu Saguior sem muito interesse no que estava acontecendo.

Dorian ficou estático. Se ele esperava obter informações do fauno, seus planos estavam desmoronando.

- Saguior, – prosseguiu ainda assim – poderia nos contar sobre o dia do roubo. Já me esqueci. – falou Dorian agitando uma das mãos perto da têmpora.

- Bem, – disse se ajeitando na cadeira – Eu estava arrumando uma prateleira na Biblioteca Central quando uma garota chamada Tâmisa Spineli surgiu procurando por um livro de poções. Eu disse que iria pegá-lo, estava com pressa, pois precisava arrumar uma seção inteira de livros antes de fechar a biblioteca. Eu me recordo bem de cada título, e quando ela me disse o nome do livro, Poções da meia-noite, eu estranhei, mas supus pertencer a uma coleção recente e por isso não estava me lembrando. Passei a procurar o tal livro que ficava do lado oposto de onde eu estava. Passei alguns minutos procurando e quando não encontrei, eu disse a ela que não tinha o livro. Desconfiei quando ela não fez uma cara de surpresa e rapidamente se despediu com um simples tchau. Preocupado eu entrei na mente dela, mas rapidamente ela me bloqueou, menina esperta. Apenas pude ver o que estava na superfície. Ela estava me distraindo.

Dorian baixou seu olhar balançando a cabeça e logo a levantou com uma expressão de choro fingido e falsas palmas.

- Bravo, bravo. Isso foi lindo, Saguior. Teve bastante tempo para pensar nessa história não?

Os olhos do fauno brilharam de indignação ao ato desrespeitoso de Dorian. Saguior abriu os braços e em seguida fez as bolas de energia de sua mão colidirem uma com a outra, arrebentando-as. Dorian arregalou os olhos, temeroso por sua vida. Estava certo.

Saguior conjurou outras bolas de energia, mas roxas e arremessou contra o ministro que voou alguns metros. Com furor, Saguior pisou com seu casco direito no peito esquelético de Dorian pressionando-o com força.

- Quem é que manda agora, heim? – disse o fauno com um brilho assassino nos olhos.

- Largue-o! – ordenou Timas que ainda estava no palanque.

- Cale a boca você também. – Saguior arremessou outra bola de luz e acertou o ministro da Comunicação Mágica.

- Alguém acuda! – berrou uma mulher desesperada. Fotógrafos acotovelavam-se em busca da melhor foto, uns usavam as próprias varinhas, outros daguerreótipos.

Em seu momento ilustre, Saguior posou para uma foto com as mãos na cintura e o casco ainda pressionando o peito de Dorian.

- Guardas! – berrou o ministro quase sem fôlego.

Dois guardas de Warren saltaram as mesas rapidamente e renderam o fauno sem esforço. Uric assistia a tudo impassível. Após ter as mãos novamente bloqueadas, Saguior foi retirado da sala do conselho. Timas já se erguia e declarava em alto tom.

- Devido a agressão, e a clara tentativa de homicídio, em nome de todos deste conselho, declaro o réu culpado das acusações e o sentencio à pena de oitenta anos em regime fechado na Penitenciária de Segurança Máxima de Warren.

Timas ergueu uma varinha e conjurou um feitiço no teto, formando um selo que representava o conselho. Era uma lua crescente com uma varinha cravada na vertical, costurando as duas pontas, e o nome Conselho de Magia.

- Oitenta anos! – exclamou Ralph pesaroso.

- Isso é uma vida inteira! – analisou Daimon.

Kal ainda não fizera seus comentários, sabia que aquilo fora premeditado entre Saguior e Cacius. Seja lá qual fosse o motivo, os dois não queriam que Dorian obtivesse as informações que esperava conseguir com aquele julgamento.

- Precisamos sair daqui sem sermos vistos. – disse Guine – Com sorte, tia Amanda nem vai perceber que saímos.

Eles rumaram até as escadas por onde subiram antes, mas elas estavam lotadas. Seguiram pelo outro lado e forçaram a passagem por entre a multidão de bruxos. Quando chegaram no último degrau, viram Cacius de costas para eles. Pararam de imediato esperando que ele saísse do salão primeiro. Mas ele permaneceu um longo tempo parado. Sua túnica azul anil destacava-se claramente entre as cores foscas das roupas dos outros bruxos, Cacius certamente não passaria despercebido em lugar algum.

- Será que ele vai ficar aí o dia todo? – questionou Ralph impaciente. Meu pai já deve estar lá fora me procurando.

Quando Cacius finalmente se moveu, de sua cintura caiu um saquinho de pano amarrado com uma fita dourada. O saquinho parecia conter algum tipo de areia.

Kal avançou e recolheu-o. Curiosamente, abriu-o e observou seu conteúdo. Ele sabia que aquele pó azul não era areia comum.

- Pó de bobetônia! – exclamou – Vamos sair daqui já!

Kal fez uma breve explicação sobre o pó e cada um pegou um punhado jogando sobre si mesmo e dizendo.

- Lago de Celacanto!

Kal sentiu seu corpo esquentar como se cada molécula estivesse em profunda agitação. Sentiu seus órgãos afastando-se uns dos outros e seu corpo se incinerar. Quando deu por si estava em frente ao lago onde Viviane os deixara.

- Demais! – exclamaram os quatro juntos.

- Ralph, a meu filho você está aí. – disse Uric surgindo por entre a multidão, Kal imaginou se ele os vira chegar.

- Pai. O julgamento não demorou tanto. O que aconteceu? – fingiu Ralph.

- Uma história e tanto, uma história e tanto.

- Nem quero saber... – prosseguiu com a encenação.

- Olá, garotos. – cumprimentou Uric – Desculpe o mau jeito, mas surgiram alguns problemas.

- Tudo bem, senhor Scheiffer.

- Kal, você pode dar um recado para sua mãe?

- Claro. – respondeu convicto imaginando como faria isso sem dizer a ela que secretamente estivera em Celacanto.

- Diga que recebi o bilhete que ela mandou por Stuart e que irei vê-la amanhã cedo.

- Tudo bem, eu digo.

- Bem, filho, precisamos ir agora. Nossa carruagem está esperando logo ali. – falou apontando para uma carruagem da GAW que era puxada por três vassouras.

- Nos vemos na escola, então. – despediu-se Ralph abraçando os amigos.

- Oh não se preocupem, talvez ainda antes. – completou Uric – Agora precisamos mesmo ir, Ralph. Até amanhã, meninos.

Os três observaram Ralph subir na carruagem com o pai e sumir segundos antes de bater no céu de pedra da cidade.

- Vamos antes que alguém mais nos veja. – disse Kal aproximando-se do lago para chamar Viviane.

A dama do lago surgiu entre as névoas com o seu insuperável ar místico de ser. Eles subiram a bordo e sentaram-se. Viviane ergueu os braços e o barco subiu até desaparecer como a carruagem de Ralph e Uric fizera.

Na manhã seguinte, Kal levantou-se cedo, a cabeça ainda doía por causa dos gritos histéricos de Amanda ao vê-los chegando de Celacanto. Ela ralhou com eles por mais de meia hora e só se acalmou depois que Kal deu o recado de Uric, foi a brecha que tiveram para escapar de mais alguns minutos ouvindo reclamações e conselhos.

No desjejum, Amanda ainda parecia incomodada com a desobediência dos três, porém não brigou mais. Kal, Daimon e Guine estavam presos agora, de portas trancadas. Amanda disse que não queria chegar àquele extremo, mas eles estavam pedindo por isso. Quando Sara tocou o interfone, Amanda pensou em dizer à garota que eles não poderiam receber visitas, mas como Sara era a única pessoa da vizinhança que se importava com os quatro, ela achou que poderia ser mal compreendida e Sara achar que era algo mais pessoal.

- Entre, querida. – disse ela abrindo o portão pelo interfone.

Sara atravessou rapidamente o jardim de entrada sobre a vigília das estátuas, adentrou na pequena varanda e com um clic girou a maçaneta e empurrou a porta para dentro.

Espremeu-se no sofá com Kal, Guine e Daimon que assistiam um programa na tv. Nenhum deles parecia muito empolgado com as imagens de uma baleia engolindo toneladas de plâncton.

- E então, como foi ontem à noite? – sussurrou Sara para os três.

- Vamos subir. – disse Guine.

Kal sentiu um arrepio estranho por todo o corpo quando Sara apoiou uma mão nos joelhos dele para se levantar de forma mais rápida. Ele olhou para onde ela tocara e ficou imóvel. Os três já estavam na metade da escada quando acordou para o tempo.

Amanda viu-o subir e o encarou de forma curiosa, como se tentasse entender a atitude estranha do filho nos últimos dias, Kal nunca fora um menino travesso, ou desobediente. Algo dentro dele estava mudando. Ela só torcia para que aquilo pudesse ser revertido.

Quando Kal entrou no quarto, Daimon, Guinevere e Sara já estavam sentados ao redor de uma pequena mesa circular no canto do quarto. Ele puxou uma cadeira e sentou-se ao lado de Daimon e Guine e de frente para Sara.

- Pela cara de vocês algo estranho deve ter acontecido ontem. – arriscou Sara vendo o rosto desgostoso dos três amigos – O que houve com o Saguior? Era esse o nome, não é?

- Sim, é Saguior mesmo. – confirmou Daimon – E ele foi preso.

- Preso? Por proteger uma caixa que poderia por em risco o mundo? – espantou-se Sara – Não sei como são feitas as suas leis, mas são estranhas.

- O julgamento não chegou a terminar. – cortou Kal – Saguior foi preso por agredir Dorian.

- O novo ministro? – inquiriu Sara, demonstrando todo seu conhecimento sobre o universo mágico.

- Exato. – confirmou Daimon outra vez.

- Dorian estava fazendo perguntas as quais Saguior parecia não querer responder. Então encerrou o julgamento com esse ataque.

- Nem tentou se defender?

- Ele deu um depoimento contando a versão dos fatos, mas acho que ninguém acreditaria. – falou Guine.

- E vocês? Acreditam?

- Sim. – respondeu Kal de forma convicta – A garota que distraiu ele na biblioteca é aliada de Kricolas.

- Como era mesmo o nome dela? – perguntou Sara, como se estivesse fazendo um grande esforço de sua memória.

- Tâmisa.

- Isso. Ela é aliada de Kricolas? Em troca de quê?

- A mãe dela, Elvira, também é aliada dele. As duas estão juntas nisso tudo. – disse Guinevere aproximando o rosto do de Sara.

- Ano passado, Cacius disse que quando uma força maior surge se opondo à força vigente, as pessoas fazem suas escolhas. Tâmisa e Elvira fizeram a dela. Vai chegar a hora em que todos tomarão sua decisão.

- Ficar e se proteger ou sair e lutar. – refletiu Sara.

- Kricolas não luta. Ele magoa. – retorquiu Kal – Uma luta é uma ação honesta em que as partes têm direitos iguais de defesa. Não é isso que ele quer, igualdade.

Sara corou o rosto, sentindo-se repreendida daquela forma. Guinevere virou-se para ele de forma séria e cutucou-lhe.

- Ah, ah... desculpe... não foi minha intenção. – Kal se levantou pedindo licença e foi até a janela. Olhou para o lago do lado de fora que refletia pacificamente a luz do sol da manhã.

- Kal. – chamou a voz de Sara ao seu lado – Não queria...

- Não tem problema, é sério. Eu só não...

- Seu pai? – ela tocou o rosto dele para virá-lo em sua direção. Kal percebeu que estavam sozinhos.

- Sabe quando uma coisa sua some e você tem a sensação de que você não a perdeu, de que você foi roubado e que agora você nunca mais terá essa coisa de volta?

- Você precisa se recuperar...

Ele balançou a cabeça negativamente.

- Não quero. Não quero acreditar que ele se foi. Não vi o seu túmulo ainda para acreditar que é possível... que é possível ele voltar para...

- Eu não sei muito sobre o seu mundo, mas não acredito que seja real uma pessoa voltar. Mesmo usando magia...

- Kricolas vai tentar fazer isso com Donnovan. Eu quero tentar pelo meu pai.

Sara sentiu seu corpo arrepiar e aproximou seu rosto mais perto do de Kal. Ela sentia sua respiração ofegante e tristonha. Não sabia o que fazer para consolar o amigo. Ela só sabia uma coisa. Queria beijá-lo.

- Sara... – disse Kal finalmente – Eu... eu gostaria de ficar só...

Ela afastou-se com um olhar também triste e saiu do quarto em direção às escadas. Kal ouviu barulhos de conversa vinda do corredor, reconheceu a voz de Guine fundida com a de Sara. As duas conversavam baixinho com medo de serem ouvidas. Ele as ignorou.

Continuou ali, olhando pela janela sem saber o que fazer. Em sua memória ele puxou imagens de seu pai sorrindo, brincando e dando alguns conselhos. Era quase nítida a sua imagem, como se ele estivesse ali. Kal correu seu olhar pelo quarto, os olhos ensopados. Ele estava ali sozinho, mas ao mesmo tempo sentia que havia alguém ali com ele. Observando-o. Ele não ligava. Nada importava naquele momento, só queria ficar ali, relembrando.

Seu olhar desatento captou uma sombra em direção a porta. A imagem quase espectral tinha uma aparência masculina muito singular. Kal sabia que não era a sombra de Daimon. De quem mais seria? Ele seguiu a sombra com o olhar até onde deveria haver pés. E havia. Um par de sapatos marrom estavam parados bem ali, na porta do quarto. Quando Kal ergueu o rosto rapidamente até o alto não viu mais ninguém, a sombra também desaparecera. Somente o que sobrara era uma voz ressoante que reverberava em sua mente. Era a voz de Adonis Foster.

- É possível, é possível...

Kal ficou estático por vários minutos. Refletindo no que supostamente ouvira e no que deveria entender daquilo. Não pretendia alarmar Guine e Daimon, muito menos Sara, com o que acontecera. Na certa não era nada. Mas ouvir a voz de Adonis em sua cabeça era algo que o deixava contente. Contente o bastante para tirá-lo daquele estado depressivo que se submetera anteriormente.

Suas forças animaram-se ainda mais ao ouvir a voz de Ralph no primeiro piso. Kal saiu do quarto às pressas até o amigo. Se havia uma pessoa para quem contar o que acabara de acontecer, esse alguém era Ralph. Eles se conheciam a pouco mais de um ano e passaram por algumas aventuras juntos em Avalon. Tinham opiniões compatíveis e dividiam o mesmo ar desconfiado pelas coisas. Para eles nada era o que realmente parecia ser. Sempre haveria um segredo a ser revelado e geralmente eram eles quem faziam isso.

- Papai, ela nos viu esfumaçar aqui. – disse Ralph apontando para Sara com a mão direita enquanto a esquerda segurava um saquinho de pó de bobetônia.

- Não faz mal, meu filho, esta é Sara Chiabai, se não me engano. Cacius me pediu que alertasse o meu pessoal para não mexer com a memória dela.

Cacius pediu a Uric que não desmemoriassem Sara? Indagou-se Kal, que estava parado no alto da escada.

- Bem, senhora Foster, – prosseguiu Uric antes que alguém perguntasse qualquer coisa – Desculpe pelo atraso, mas não pude vir antes. Podemos conversar. Em particular?

- Claro, venha até aqui na cozinha. – disse Amanda guiando o homem para longe do alcance dos garotos.

- Captus! – disse Kal com a varinha no ouvido. No ano anterior, ele aprendera esse feitiço de superaudição com dois bruxos desconhecidos na cidade de Dunas.

- Senhor Scheiffer, gostaria que as crianças ficassem em maior segurança. Não acredito que aqui seja o melhor lugar para eles neste momento. – disse Amanda – Celacanto está fervendo com toda essa agitação causada pelo roubo da Caixa de Pandora. Eles ficam loucos de tanta curiosidade e acabam pondo em risco a própria vida.

- Sim, senhora, compreendo sua preocupação e acho que tenho uma alternativa, se a senhora permitir, claro.

- Por favor, me diga qual a alternativa?

- Levá-los para minha casa!

Kal largou a varinha com um olhar surpreso. Eles iriam até o vale onde Ralph mora. Seria perfeito. Assim ele poderia conversar com o amigo e por em ordem os seus sentimentos por Sara. Mesmo que a idéia de ficar longe dela o incomodasse um pouco.

- Oi. – cumprimentou Ralph ao ver Kal sentado no primeiro degrau do segundo andar.

- Oi. – correspondeu – Senta aí. – disse chegando para o lado e dando espaço para o amigo.

- Noite estranha ontem, não?

- Com certeza.

- Sabe por que estamos aqui?

- Para pedir a minha mãe se podemos ir para a casa de vocês. – respondeu Kal sem problemas.

- Andou treinando adivinhação? – perguntou ele espantado.

Kal mostrou-lhe a varinha e Ralph rapidamente deduziu.

- Captus.

Ele agitou a cabeça dizendo que sim.

- E sua mãe permitiu?

- Não terminei de ouvir a conversa.

- Você sabe por que Cacius pediu ao meu pai que não desmemoriasse a garota? – indagou Ralph mudando de assunto.

- Não. Mas quero descobrir o quanto antes. Se soubesse disso teria perguntado ontem mesmo.

No primeiro piso, Sara levantava-se do sofá e despedia-se de Guine e Daimon. Quando passou ao lado da escada olhou rapidamente para ele, sorriu e abaixou a cabeça. Aquela era a última vez que se veriam por longos meses.

- Muito bem, senhora Foster, volto para buscar os três hoje à noite. – disse Uric abrindo a porta da cozinha no mesmo momento que Sara fechava a porta da entrada.

- Sinto-me tão mais tranqüila. – confessou Amanda.

- O que houve, tia Amanda?

- Queridos, arrumem suas malas. Vocês vão para a casa do senhor Scheiffer esta noite.

O sorriso brilhou no rosto deles. Finalmente estariam livres das limitações impostas naquela casa. Ralph morava dentro de um vale ali por perto, um lugar onde poderiam usar magia livremente e poderiam ficar ao ar livre sem perturbações maiores. Só o que precisavam fazer era esperar.

As horas passaram com muito esforço. Estranhamente, quando se quer logo que chegue determinada hora ela parece vir a passos incomumente lentos. Ralph ficara com os Foster para o almoço e ajudou-os a arrumar as bagagens. Eles assistiram tv, já que estavam estritamente proibidos de pisar fora de casa e como sempre não passava nada que fosse de interesse. Os noticiários não exibiram nenhuma matéria sobre assassinatos incomuns, o que era uma pequena prova de que Kricolas estava silencioso, no momento.

Quando o relógio da cozinha marcou sete horas, Kal, Guine e Daimon já haviam descido suas malas até a sala. Amanda pedira para Stuart comprar o já comercializável pó de bobetônia, assim eles não precisariam encarar mais algumas horas de viagem em uma carruagem. Em segundos estariam na casa de Ralph.

Uma fumaça verde limão surgiu em cima do tapete. Uric acabara de esfumaçar dentro da casa dos Foster.

- Boa noite, senhora Foster. Boa noite, meninos. – cumprimentou – Estão prontos?

- Obrigada mais uma vez, senhor Scheiffer. – agradeceu Amanda.

- Não há porquê. Vai ser bom pra eles também. Mas a senhora tem certeza de que não deseja ir junto? Ficar aqui sozinha, eu não sei... parece... solitário.

- Não se preocupe. E pare de me chamar de senhora, pareço velha.

Uric riu-se, acenou com a cabeça e pediu o mesmo.

- Tudo bem, então. Vamos nessa. Até mais, Amanda.

Uric bateu uma continência engraçada e esfumaçou.

- Até mais, mamãe. – disseram Kal e Daimon abraçando-a.

- Vocês vão ficar na casa dos Scheiffer até as aulas começarem. Vou passar lá para levar seus materiais. Em menos de duas semanas nos veremos novamente.

- Tchau, tia Amanda.

- Tchau, querida.

Ralph fez um aceno e enfiou a mão no saquinho de pó de bobetônia, bateu com a mão cheia no peito e foi engolido por chamas azuis.

Kal, Daimon e Guine também pegaram um pouco de pó e juntos disseram.

- Vale Cratera!

As mesmas chamas que engoliram Ralph devoraram ardentemente os três garotos. Kal viu sua mãe por entre a janela de fogo azul a sua frente. Ela chorava. Como acontecera em Celacanto, ele sentiu seu corpo aquecer rapidamente e uma agitação inquieta dos seus órgãos. Sentiu-se incinerar e logo mais seu corpo resfriar rapidamente quando ele alcançou o chão da casa dos Scheiffer.

Eles esfumaçaram bem em cima de um tapete amarelo com runas antigas escritas dentro de um círculo. As paredes eram de madeira encerada, com móveis em estilo medieval, todos muito bonitos e preservados, grandes almofadas onde supostamente deveria haver um sofá, um lustre de cristal pendia do teto iluminando todo o ambiente em tons amarelos. Não havia janelas. Uma porta de cedro dava acesso ao outro cômodo e uma outra porta dupla de cedro parecia levar para o exterior, havia uma fraca luz por debaixo das frestas da porta. Tapeçarias com gravuras de bruxos imponentes estavam penduradas nas paredes, orgulhosamente exibindo os antepassados de Ralph. Estantes de mogno guardavam livros e objetos estranhos, alguns vasos curiosos como formas irregulares e pintura singular, como um que tinha o formato da cabeça de uma pessoa que gritava desesperadamente, podia sentir a aflição nas marcas dos olhos.

O piso de madeira também polida era tão lustroso que poderia ser usado como espelho. No canto da sala havia uma escada de aço que tanto subia para o segundo andar, quanto descia para o que deveria ser um porão. O teto era recoberto por um tecido dourado que ajudava a refletir a luz do lustre dando à sala dos Scheiffer um aspecto majestoso. Dignos de um rei.

- Bem, chegamos. – comunicou Ralph largando-se em cima de uma almofada.

- Olá, garotos! Que bom que vocês chegaram! – A mãe de Ralph, Samanta Scheiffer, abrira a porta de cedro que dava acesso a uma cozinha e apressou-se para abraçá-los – É bom vê-los novamente, Daimon e Guine. Kal, acredito que não nos vimos no ano passado, naquele incidente com os Griphons.

Samanta era uma mulher alta e de pele muito clara, cabelos loiros e ondulados, os olhos azuis e um nariz um pouco empinado. Ela tinha as feições de uma modelo, mas era uma poderosa guardiã de Warren.

- Olá, senhora Scheiffer. É um prazer conhecê-la. – saudou-a Kal.

- Bem, vocês vão ter que nos dar licença, mas é que eu e Uric temos muito serviço em Warren.

- Mamãe! – exclamou Ralph – Já é tarde e temos visita. Vocês precisam mesmo ir?

- Desculpe, filho. Mas o pessoal do Dorian nos deu uma pista de onde Kricolas pode estar. É melhor averiguarmos bem ou o Folha Mágica vai ralhar com a gente.

- Tudo certo, pai... já estou acostumado mesmo...

Sem mais palavras ou gestos, Uric e Samanta esfumaçaram deixando um rastro colorido de verde limão e um caramelo intenso.

- É como eu já disse a vocês. Eles nunca estão aqui.

- Não esquenta, Ralph. – tranqüilizou Guine – Eles estão prestando serviços a toda a comunidade mágica. Devia se orgulhar.

- Ah eu me orgulho. É claro que me orgulho, nunca disse que não, mas precisa ser sempre assim? Ainda mais agora com esse novo ministro.

- O que tem ele? – perguntou Kal, desconfiado.

- Dorian montou uma milícia, as Salvações Nacionais. Acho que poucos sabem disso, mas ele montou. Reuniu bruxos poderosos de todo o país, agora eles ficam vasculhando cada centímetro quadrado, levantando todos os tapetes em busca de sujeira e todo dia surge uma pista sobre o paradeiro de Kricolas.

- E eles nunca acham? – questionou Guine.

- São todas pistas falsas ou mal contadas. Eles se disfarçam e ouvem relatos de não mágicos e quando surge algo estranho eles comunicam GAW.

- Mas por que eles mesmos não vão averiguar? – indagou Kal.

- Não sei. – disse francamente – As Salvações Nacionais tem o objetivo de deter Kricolas, mas só o que fazem é recolher pistas. Papai está incomodado com isso.

- Por quê?

- Guine, pense. Se as Salvações Nacionais continuarem se expandindo e “descobrindo pistas” que levem a Kricolas, logo ela terá mais poder do que GAW.

- Dorian não tem controle sobre GAW. Mas tem sobre as milícias. – deduziu Kal agilmente.

- É. Mas para quê ele quer essa disputa? – prosseguiu Daimon.

Os três deram de ombros.

- Chega disso. Vamos comer alguma coisa.

Na cozinha, Ralph destapou algumas panelas que sua mãe colocara para cozinhar e descobriu alguns pratos que pareciam deliciosos. Eles serviram-se com um caldo de galinha com milho verde e um tempero apimentado.

Depois de limparem a panela, no sentido literal, eles passaram um tempo sentados na sala conversando sobre diversos assuntos. Kal contara a experiência que tivera no circo quando foi atacado por Griphons e como ele usou o feitiço que aprendera com Saguior para salvar-se e também a Sara. Seu coração palpitou quando disse o nome dela.

- Kal está apaixonado pela garota. – disse Guinevere interrompendo a história.

Ralph fez uma cara de surpresa.

- E a Emanuela?

- Não presta atenção no que essa boba diz.

- Está escrito na sua testa, Kal. “EU AMO SARA”.

- Vivemos em mundos diferentes. – protestou Kal.

- Vocês são vizinhos. – corrigiu Ralph, rapidamente.

- Tudo bem. O que mais temos em comum?

- Simetria bilateral. – disse Daimon distante – A desculpe.

- Você está certo, Daimon.

- Kal, ela é humana, você é humano, ela gosta de você, você gosta dela. – disse Guine por partes – Isso são o que vocês têm em comum e é mais do que o suficiente.

- Por que você está tão interessada em nos ver juntos? – perguntou Kal - Algum motivo em particular?

- Ela odeia a Emanuela. – disse Daimon, mais uma vez, enquanto brincava com os dedos – Desculpa outra vez...

- Você está certo de novo, Daimon! – falou Kal, enfático.

- Escuta, aquela sebosa nem deve saber que você existe.

- Passamos metade do ano juntos! – retrucou.

- Em reuniões do Conselho Estudantil, Kal. Mas quantas vezes ela te disse um “oi”?

Ele abaixou a cabeça e ficou pensativo. O que ela dissera sobra Emanuela era verdade. A katziniana nunca demonstrara interesse por ele. Passaram metade do ano lado a lado em uma sala do sexto andar de Avalon, porém nunca trocaram uma única palavra.

- Talvez ela seja tímida. – falou Daimon do seu canto e desta vez resolveu calar a boca, em definitivo.

- Garotos...

Às onze horas, Ralph levou os três para o segundo andar e mostrou-lhe os quartos. Um para cada. Kal não fez cerimônias e atirou-se em cima da sua cama para uma rápida descansada. Preguiçosamente, levantou-se e tomou um demorado banho de espuma, atirou-se na cama outra vez, enrolou-se nas cobertas para se proteger do frio que fazia dentro do quarto, mesmo sendo verão e o aposento não ter uma única janela – nenhum cômodo da casa tinha – era como se o Vale Cratera possuísse um sistema de resfriamento invisível.

O sono veio com facilidade e ele descansou seu corpo e mente dos dias de tensão. Kal ainda pensava na injustiça cometida contra Saguior e ficou raciocinando por alguns minutos até cair em um abismo escuro... tranqüilizante.

Na manhã seguinte, ele foi o último a se levantar, como sempre acontecia. Arrumou sua cama, mudou de roupa e desceu para o café. Guine, Daimon e Ralph já o estavam terminando e quando Kal mordeu seu primeiro pedaço de bolo, os três disseram que iam para fora ver Osíris, o falcão de Ralph.

Kal acenou com a cabeça em gesto de compreendimento e depois que engoliu o bolo disse que logo se juntaria a eles. Após beber o restante do seu suco de maracujá em um único gole, ele ainda passou alguns minutos sentado na cadeira observando o ambiente.

A cozinha dos Scheiffer não diferia muito da de sua casa. Possuía alguns balcões grudados à parede, uma pia grande de mármore, alguns armários pendurados no alto da parede e outro armário que tinha a mesma função de uma geladeira, mas não era elétrico e sim mágico. Um fogão com seis bocas e um forno que seria capaz de assar um leitão inteiro. O chão era coberto com uma combinação de pisos de cerâmicas branca e cinza parecendo um enorme tabuleiro de xadrez. A mesa do café estava próximo à parede onde havia pendurado um quadro gigante com uma paisagem natural, dando uma falsa impressão de que alie havia uma janela.

Ele serviu-se de mais um pouco de suco e quando recolocou a jarra em cima da mesa viu através do reflexo por ela produzida, uma figura masculina muito familiar escorada na porta de cedro de acesso à sala.

- Pai! – exclamou Kal, virando-se rapidamente, mas não havia ninguém.

Mais uma vez frustrado por ter sido enganado por sua mente esperançosa e iludida, ele terminou rapidamente seu suco e saiu da cozinha para procurar Ralph, Guine e Daimon. Ele não podia esquecer o que vira. De forma alguma. Sabia da existência de fantasmas, mas não tinha muita certeza sobre a forma que eles se mostravam. De qualquer modo, ele ouvira Adonis antes, e agora o vira quase que nitidamente. E isso não era um fato para se ignorar.

Kal passou pelas portas duplas da entrada e deparou-se dentro de uma caverna. Havia um corredor de pedra escura que separava a entrada da casa até o lado de fora. Um jardim muito bem cultivado guardava a abertura dentro da pedra que subia ingrememente até uma floresta no topo do vale. Kal olhou para um dos lados e viu um canteiro coberto por plantas mágicas chamadas Fantara d’ouro, uma planta que muito se assemelhava a um girassol comum, exceto pelo caule vermelho e cheio de pequenos tubérculos que ardiam como brasa ao sol.

- Oi. – cumprimentou Kal sentando-se junto aos amigos nas margens de um pequeno lago.

- Não é tão grande quanto o de vocês, mas dá para o gasto. – brincou Ralph.

- Você mora em um lugar bem legal. – disse Daimon.

- É, é legal sim. – concordou – Mas já imaginaram como seria morar em um lugar como Cidade dos Elfos?

- Seria legal. – imaginou Daimon – Não sei por que Cacius não nos mandou para lá ao invés de Anomatí.

- Ele me disse que Cidade dos Elfos não é mais como antes. – respondeu Kal, atirando uma pedra no lago. Ela quicou algumas vezes antes de afundar – Você sabe de alguma coisa, Ralph?

- Sei que ela está sob a vigilância das milícias de Dorian. Só isso.

- E GAW? – indagou Guine.

- Dorian disse que a presença de GAW não transmitiria “segurança” para os moradores de lá.

- Não acredito...

- Esse é o nosso ministro, Guine.

- Podemos deixar esse assunto de lado pelo menos por agora? – perguntou Daimon desanimado com o rumo da conversa.

- Alguém sabe de Thalis? – perguntou Ralph seguindo a sugestão do amigo.

- Ele não escreveu. – disse Kal – Mas duvido que saiba onde estamos morando agora.

- Podemos enviar um recado por Osíris. – disse Ralph acariciando a cabeça do falcão ao seu lado.

Os três entraram novamente na casa, Ralph subiu rapidamente para pegar um pergaminho e uma pena com tinteiro para iniciarem a carta.

- Papai trouxe está pena da Inglaterra mês passado. É uma pena que escreve o que se diz, legal, não? – disse Ralph entusiasmático – Vamos testá-la.

Thalis,

Oi... não se deve começar uma carta assim, acho... RALPH! A pena escreveu o que você disse! Certo, Guinevere, olha, está escrevendo isso também... vamos seguir então. Faz um parágrafo, pena.

Isso. Droga, continua escrevendo. Outro parágrafo.

Desculpe pelas linhas acima, foi um erro nosso. Como deve ter percebido é o Ralph quem está ditando a carta, Guine, Kal e Daimon estão aqui em casa, eles vão ficar o restante das férias comigo, só faltou você e o Jonathan, que segundo o Daimon está de férias na Argentina. Mas como você está? Espero que esteja bem, nosso último ano não foi muito fácil, especialmente para você... RALPH! Não fique lembrando essas coisas... Por Merlin, a porcaria da pena escreveu tudo. Guine, você está estragando a carta. Outro parágrafo.

Desculpe outra vez Thalis, acontece que a pena escreve sozinha o que nós dizemos, mas ela não é boa o suficiente para entender o que faz parte da carta ou não. Vai entender.

Mande notícias pelo Osíris mesmo, precisamos saber de você. Outro parágrafo, pena, e pule uma linha.

Assinado, dois pontos. Não acredito! Que pena burra! Pula outra linha.

Aguardamos sua resposta. Pula linha...

Assinado: Ralph. Eu quero assinar também, põe aí pena, embaixo de Ralph

Guine... vai, pena, coloca Kal e Daimon também embaixo de Guine. Ah Ralph, eles que tinham que dizer. Então digam...

Kal e Daimon

Ralph isso precisa de conserto...

Percebi, Daimon... percebi...