quarta-feira, 5 de março de 2008

Capítulo 1 - Kal Foster e o Mestre das Sombras

Para Mardo Runifer, o ministro da Defesa e Segurança Mágica, aquele dia fora o mais cansativo do mês de janeiro. Após as comemorações de natal e ano novo, todo o país parecera explodir em conflitos. Incidentes mágicos aconteciam por toda parte e o governo teve que dobrar o número de funcionários para inspecionar as cidades mágicas que a cada novo dia preocupavam-se menos em manter-se em segredo. Há mais de mil anos bruxos e não mágicos deixaram de viver juntos, os bruxos refugiaram-se em suas florestas, erguendo pequenas cidades protegidas por encantos de forma que nenhum humano não mágico pudesse descobrir sua existência.

Após a nova fuga de Kricolas, semanas antes, na Cidade dos Elfos, e o sepultamento de Adonis Foster, bruxos de todo o Brasil passaram a migrar para os países vizinhos em busca de proteção e apoio. Um número cada vez maior de pessoas anunciava ter visto carruagens voadoras e pessoas montadas em vassouras atravessando cidades inteiras. O Ministério do Segredo Mágico, responsável por manter secreta a existência de criaturas mágicas no Brasil, tentou contornar a situação enviando bruxos disfarçados de ufólogos. Eles se infiltravam na população destas cidades e espalhavam boatos sobre disco voadores e alienígenas. Em pouco tempo a situação foi controlada e as pessoas se convenceram de que não estavam vendo nada de mais, as carruagens voadoras na verdade eram “apenas aviões de teste”, pois era mais simples aceitar essa idéia que a de seres de outro mundo.

Com os humanos sob controle, o Governo, através do Ministério da Defesa e Segurança Mágica, alegou que ninguém corria riscos de permanecer no país e que não havia motivos para que as pessoas abandonassem suas casas. A fim de aliviar ainda mais as tensões, Mardo Runifer anunciou pelo jornal Folha Mágica, o maior tablóide mágico do país, que dois terços da Guarda Armada de Warren, soldados da maior penitenciária para bruxos e criaturas mágicas do país, estava fazendo rondas periódicas em busca de Kricolas e seus aliados, Elvira Lugunster e sua filha Tâmisa, que no ano anterior haviam contribuído para que o meio-vampiro roubasse o Livro de Merlin, o maior livro de magia do mundo e que fora escrito pelo próprio mago Merlin há quase mil anos.

Agora, o ministro Mardo chegava ao seu escritório exausto e louco para sentar-se em sua larga poltrona de espumas. A sede do Governo Mágico estava localizada entre os estados do nordeste do Brasil, onde nenhum humano seria capaz de chegar sem recorrer à magia. Escondido pela vegetação agreste e pela terra seca nordestina, o prédio de dois andares e de formato circular abrigava todas as repartições públicas e abrigava algumas salas particulares que eram alugadas para alguns empresários.

Mardo esfumaçara no corredor do segundo andar onde ficava sua sala, as luzes estavam apagadas, mesmo já sendo noite, e aparentemente todo o prédio estava vazio. Esfumaçar é a maneira mais prática de se deslocar de um lugar a outro para os bruxos, um tipo de teletransporte. Mardo arrastou sua pasta de couro embaixo do braço suado por causa do paletó marrom que trajava. A cabeça redonda e quase toda afetada pela calvície, suava a ponto de respingar no tapete vermelho estendido. Os últimos dias não haviam sido gentis com o ministro. “Muita pressão. Muita pressão”. Repetia ele.

Quando já se aproximava de seu destino viu que uma das salas no final do corredor à esquerda estava iluminada e decidiu ir até lá para espiar. Raramente alguém ficava no prédio depois das oito, mesmo em situações tão críticas. A única vez que isto acontecera fora há poucas semanas, no primeiro dia de trabalho do jovem Bernardo Mecflex, ou Escritor da Terra, como também era chamado.

- Quem diabos está naquela sala? – indagou-se Mardo quase enfurecido.

Não havia sons vindo de parte alguma e o corredor estava escuro quase que por completo, sua única fonte de luz era a da misteriosa sala.

- Algum funcionário irresponsável deve ter esquecido a lâmpada acesa. Estes incompetentes que me mandam. – bufou furioso – Nunca chegarão a lugar algum na vida, que desperdício de oxigênio, essa gente.

Em certo ponto a luz da sala se apagou e então Mardo soube que alguém estava ali ainda. Só não tinha idéia de quem poderia ser. Tateou no escuro enquanto procurava por sua varinha no bolso do paletó para iluminar o lugar. Sentiu-a entre os dedos, mas no momento em que ia sacar a varinha, deixou-a cair no chão. Bufando, abaixou-se para apanhá-la, assim que ergueu o gordo corpo para cima ele esbarrou em algum outro corpo fazendo-o desabar no chão num só baque.

Demonstrando uma agilidade tremenda, o ministro empunhou a varinha para frente, pronto para disparar o primeiro feitiço.

- Escap...

- Sou eu, ministro! – disse a pessoa que esbarrou em Mardo – Bolhasradiant!

Uma imagem quase espectral se conjurou na frente do ministro da Defesa e Segurança Mágica sob a fraca luz que incidia a sua frente.

- Dorian? – disse Mardo ajudando o outro a se erguer – Que raios de coisa está fazendo aqui uma hora desta?

- Ah, me desculpe, senhor. Estava terminando de ler os relatórios do Bernardo. Ele tem feito alguns progressos com os experimentos. O relatório diz que ele está próximo de um resultado satisfatório. – respondeu o bruxo que agora se mostrava mais visível.

- Não podia deixar isto para amanhã? – indagou.

- Estamos passando por um período de crise, senhor. Seria prudente terminarmos logo este serviço em especial. Acalmaria os ânimos das pessoas.

- Não estamos em um período de crise, Dorian, por mil chifres de unicórnios! Lembre-se disto, se quisermos que as pessoas acreditem que o país ainda é um lugar seguro para se viver devemos começar nos convencendo de que o é. Entendeu?

- Sim, senhor. – respondeu prontamente.

- Agora vá para casa. Descanse, pois amanhã será outro longo dia de trabalho.

- Tudo bem então, senhor. Tenha uma boa noite de sono.

- Se eu for dormir, você quer dizer. Sinto saudades quando meu maior problema eram duendes rebeldes e bruxos gatunos...

- Não se preocupe tanto, senhor, vivemos em um país seguro, lembra-se?

- Este é o espírito, Dorian, este é o espírito... até mais.

Dorian Gulemarc seguiu corredor afora carregando seus pouco mais de sessenta quilos e aparência esquelética, os cabelos totalmente desalinhados e um rosto exausto, onde as olheiras praticamente escondiam os olhos castanhos e o nariz parecia dobrar de tamanho a cada dia ganhando todo o espaço de onde deveria haver uma boca, que raramente se fechava.

Mardo retornou para seu caminho, ainda mais louco para sentar-se em sua poltrona de espumas, ficara ansioso por isto o dia inteiro. A mesa de sua secretária estava vazia, se não apenas por um copo de café. Todos os dias, antes de ir embora, ela preparava um pouco da bebida e depositava em sua mesa para que o ministro tivesse o que beber em sua ausência.

- Obrigado mais uma vez, Tifany. – agradeceu Mardo apanhando o copo após perceber que ele fora devidamente enfeitiçado para não esfriar.

O ministro despejou sua bolsa de couro na mesa largou o corpo em sua poltrona de espuma soltando um largo “ah” de satisfação. Bebericou seu café e começou a ler os bilhetes em sua mesa.

- Reunião com o presidente no sábado... ler relatórios de Bernardo Mecflex... enviar tropa de apoio aos guardas no sul do país... e ora ora. – disse o ministro parando de supetão e inclinando-se para frente – Um recado de Cacius! O que este velho caduco quer comigo?

Cacius, o diretor da maior escola de magia do Brasil, Avalon, de longe era um velho caduco. Ostentava o reconhecimento de maior autoridade em magia da América do Sul, acumulava prêmios de Honra ao Mérito reconhecidos internacionalmente e era um dos bruxos mais influentes no meio mágico, nos dias atuais. Raramente ele entrava em contato com pessoas senão de seu corpo docente, Cacius tinha a incrível habilidade de resolver seus próprios problemas sozinho. Coisa que muita gente não conseguia mais. Era isto que intrigava Mardo Runifer, o porquê do recado. Nele, Cacius solicitava que o ministro comparecesse ao seu escritório em Avalon para uma reunião imediata. O diretor não ocupava um cargo público, desinteressou-se pelo assunto após a primeira decepção, sua única prioridade era o bem estar dos humanos, bruxos, ou não, e demais criaturas mágicas.

- Quanta petulância! Eu sou o ministro e ele exige que eu vá vê-lo! – resmungou Mardo – Que se dane este velhote! Tenho muito mais com o que me preocupar. Na certa ele quer me mostrar aquele quadro esquisito em sua sala, francamente...

O quadro a que o ministro se referia era uma pintura a óleo de Merlin sob a sombra de uma macieira. Cacius dizia que aquele quadro era uma espécie de termômetro de perigo e que nos últimos dias tem alertado que o mundo está à beira de um colapso. Cacius insistia que o fato de Merlin estar olhando para os lados a todo o momento tem íntima relação com a liberdade de Kricolas e o fato dele ter adquirido o Livro de Merlin.

Em sua última conversa com o diretor da escola, Mardo havia deixado claro que não permitiria que Cacius se pronunciasse diante a população sobre o assunto. Relutante, Cacius foi obrigado a concordar, pois caso contrário teria sua escola fechada. E esta era a última coisa que ele queria.

- Estou te avisando, Mardo. É um grande engano. E você será o primeiro a pagar pelos seus erros... me escute, por favor – insistia o diretor – Não pode esconder a verdade destas pessoas. Não tem o direito... elas precisam saber a dimensão do perigo.

Segundos depois, sem nem mesmo dizer uma única palavra, Mardo saíra do escritório de Cacius.

Voltando ao presente, ele refutou o bilhete jogando-o em uma lixeira e passou a analisar os demais. Após uma breve olhada, segurou seu copo de café quente mais uma vez e reclinou na poltrona balançando-se de um lado ao outro.

Ele girava a poltrona até sua estante de livros, que acumulava volumes de diversos assuntos, ele rodava novamente e tinha uma visão privilegiada de toda a sua sala, com piso de madeira e tapete marrom, paredes também de madeira quase que completamente tapado por estantes, montes de caixas e papéis, sua mesa não era uma das mais arrumadas, havia vários relatórios por cima dela, penas, tinteiros, agenda e folhas de pergaminho em branco com o selo do governo. No teto pendia um lustre de vidro com uma das lâmpadas queimadas, era difícil mantê-las funcionando com tanta magia circulando pelo lugar.

Do lado oposto a sua estante estava uma janela que ia do chão ao teto, as cortinas estavam abertas e a fraca luz da lua iluminava o ambiente. Mardo continuou com sua brincadeira na poltrona por longos minutos até quase cair no sono. Lembrou-se de outros incidentes mágicos que haviam ocorrido nos últimos dias no mundo dos humanos, a maioria deles envolvia a aparição de uma estranha criatura grande, forte, enrugada e com par de asas de morcego. Kricolas.

O meio-vampiro estava de fato dando uma tremenda dor de cabeça ao ministro e todo o seu pessoal. Ele aparecia e desaparecia dos lugares como um fantasma. Nunca deixava pistas e jamais cometia erros. Suas ações eram sempre precisas e no tempo certo.

Há três dias ele aparecera no sudeste do país e atacara três homens que saiam de um bar. Com essas três vítimas o vampiro contabilizava vinte mortes desde Adonis Foster. Os corpos foram encontrados por uma senhora de meia idade na manhã seguinte. Ambos estavam com mordidas no pescoço. Na cidade o caso foi registrado pela polícia e apelidado de “O vampiro suga álcool”, devido ao estado de embriagues dos homens.

Stack.

Mardo levantou assustado com o que ouvira. O estalo pareceu ser dentro de sua própria sala. Parou por um instante. Analisou e apurou os ouvidos, mas não ouviu mais nada. Decidiu então perguntar.

- Dorian? É você? Já disse que pode ir para casa, homem. Vá descansar!

A voz ecoou pela sala, mas não houve resposta. Mardo decidiu que aquilo era apenas sua imaginação. Estou cansado. É só isso. Apenas cansaço.

Ele tocou o pé no chão para dar um impulso à cadeira para que pudesse voltar a se balançar de um lado para o outro novamente.

Girou o corpo para a estante. Depois para a janela. Estante. Janela. Estante... e quando pela quarta ou quinta vez que se virava para a janela sentiu cada pelo de seu corpo eriçar ao ver a fantasmagórica sombra formada a sua frente. O coração de Mardo quase saltou pela boca ao ver aquela figura horrenda dentro de sua própria sala.

- Feliz em me ver? – indagou Kricolas.

- O... o... que... fa...

- O que faço aqui? É isto que quer perguntar, seu gordo medroso? – Mardo continuava estático e Kricolas sorria mostrando seus dentes amarelos e desalinhados – Eu pensei em deixar hora marcada, mas achei que sua secretária não encontraria lugar na agenda para mim.

- O que... o que... o que você fez com ela seu maldito! – grunhiu Mardo tomando coragem.

- O que fiz com ela é passado, meu amigo. Deveria estar mais preocupado com o que vou fazer a você.

- Oras seu!

- Quanta valentia. Quem diria que por trás de tanta banha existe um espírito valente. – debochou Kricolas.

- Estou melhor do que você.

- Quero ver daqui a mil anos. – falou Kricolas irônico – É uma pena que não vá chegar nem aos cem.

- O que você quer de mim?

- Que sua equipe pare de me atrapalhar. Francamente! Eles estão por toda parte!

- Oras cale-se!

Kricolas avançou em direção de Mardo, agilmente, e dobrou seus dedos sobre a garganta do ministro dizendo:

- Não me dê ordens!

Mardo segurou o braço que Kricolas usava para sufocá-lo e então sentindo a respiração falhar balançou a cabeça assentindo que entendera bem o recado.

- Muito bom. Melhor que comecemos a nos entender cedo. – disse Kricolas soltando-o – Diga-me, onde está a família Foster!

- Não sei do que está falando. – desvencilhou Mardo.

- Não brinque comigo! Eu sei que o seu maldito governo tirou os Foster de Vila da Cachoeira!

- Realmente não sei do que você está falando...

- Mardo, seu inútil! Minha paciência está estourando. Quer me dizer onde-estão-os-malditos-Foster?

- E para quê? Já não arruinou o suficiente aquela família? Você já matou Adonis Foster! O que ainda quer? Matar três crianças e uma mulher? – indagou o ministro cheio de coragem.

- Bela atitude. Digna de elogios. Já que estamos nos entendendo tão bem, vou lhe contar o meu interesse neles.

- Vá para o inferno!

- Não me dê ordens! – berrou Kricolas mais alto do que um humano normal poderia gritar, uma voz gutural e cheia de ódio paralisou cada célula do ministro – Eu visitei o inferno em Warren, e não pretendo voltar para lá.

- Em pouco tempo você vai desejar estar lá.

- Por favor, ministro, tenha senso do ridículo. Em pouco tempo mestre Donnovan estará de volta! E eu governarei ao lado dele. Talvez eu use esta mesma sala quando estivermos no poder.

Mardo se contorcia na poltrona espiando por cima da mesa até a porta, torcendo para que ela se abrisse e que pelo menos dez guardas de Warren entrassem disparando feitiços para todos os lados e prendessem Kricolas definitivamente.

- Não seremos incomodados por guardas hoje ministro. – falou Kricolas como se tivesse lido a mente de Mardo – Certifiquei-me de que o prédio está vazio.

- Você sempre pensa em tudo, não é?

- Modestamente? Sim. – riu-se sardonicamente – Fazemos de tudo para sobreviver neste mundo, ministro.

- Cretino.

- Elogios não pouparão sua vida.

- E então? Qual o plano com os Foster? – perguntou Mardo para distrair Kricolas enquanto ele alcançava sua varinha no bolso do paletó.

- Achei que não estivesse interessado. – respondeu Kricolas dando as costas para o ministro.

- Ora, se vou morrer. Quero morrer sabendo alguma coisa.

- Isto foi quase filosófico.

- Vai me dizer?

Mardo ergueu a varinha com dificuldade, suas mãos tremiam e suavam muito. No momento em que preparava para dar o golpe certeiro em Kricolas, este virou-se mais rápido do que uma bala e fez com que a varinha de Mardo saltasse de sua mão e ficasse grudada no teto.

- Pensou que poderia me enganar?

- Parecia uma boa saída.

- Gosto do seu humor. – falou Kricolas após uma breve risada.

- Esta é a parte que você me convence a passar para o seu lado e ajudar você no seu plano maluco de ressurreição de Donnovan?

- Isto nunca foi uma opção, ministro.

- Bem, você recrutou a criada de seu pai e a filha e pelo que soube tentou persuadir o jovem Kalevi Foster a te seguir.

- Anda muito bem informado para alguém do governo.

- Por que o interesse em Kalevi?

- Kal para os íntimos.

- Você matou o pai dele!

- É minha maneira de começar uma amizade.

- Você é repugnante.

- Obrigado. – piscou – Muito bem então. Já que pretendo matá-lo, não há mal você saber o que planejo.

- Sou todo ouvidos. – confortou-se Mardo, ainda imaginando, esperançosamente, que mil guardas fossem entrar ali a qualquer minuto.

- O pequeno Foster tem o Enid de mestre Donnovan. E pretendo fazer com que este Enid domine todo o corpo e a mente de Kal.

Enid é a parte mágica de um bruxo, um tipo de alma que se recebe ao nascer. Crianças bruxas não choram ao nascer porque recebem um Enid. No entanto, há treze anos, quando Kal Foster nasceu, ele chorou feito um bebê humano qualquer e somente seis anos depois ele misteriosamente recebeu seu Enid. Naquele momento ninguém imaginou como aquilo poderia ser possível, mas no ano anterior, Kricolas contara ao próprio Kal como ele adquirira o Enid de Donnovan.

- Você é um porco imundo mesmo, Kricolas!

- Obrigado. Obrigado. Não é todos os dias que encontramos pessoas tão agradáveis como você.

- Você não passa de um covarde! Precisa do seu grande mestre para fazer com que as pessoas te obedeçam, não é? Você não é tão bom assim.

- Não se trata de covardia! – Kricolas bateu firme sua mão direita na mesa, o suficientemente forte para parti-la em alguns pedaços – E sim de lealdade!

- Quase mil anos já se passaram Kricolas... não há como trazê-lo de volta. Kal Foster não se renderá ao Enid de Donnovan.

- Eu sempre penso em tudo. Lembra-se?

- O que quer dizer?

- Se o pequeno Foster não quiser cooperar terei que fazer da maneira mais difícil.

- Retirar o Enid dele?

- C'est la vie. Kricolas dá, Kricolas tira.

- Você sabe bem que para fazer isto ele precisa estar...

- Morto. Isto mesmo. Vejo que não faltou a nenhuma aula na escola, ministro.

- Não vai ser tão fácil arrancar a vida de um aluno de Cacius, ainda mais sendo ele um Foster.

- Oras cale-se. Cacius não é problema para me preocupar. Já tirei o Livro de Merlin dele. O que pode fazer?

- Não duvide daquele velho.

- Quem te vê falando deste jeito pensaria que você é muito fiel a ele.

- Se cheguei aonde cheguei foi porque Cacius me apoiou.

- E parece que você não soube retribuir muito bem tantos favores.

Mardo calou-se ao olhar na lixeira o bilhete amassado.

- Termine logo com isto. Vamos!

- Disse para não me dar ordens. – falou Kricolas agarrando Mardo pela garganta mais uma vez – Será o seu fim!

Mardo examinou sua sala por um último segundo sabendo que aquela seria sua última visão. Ele passara tantos anos entre aquelas quatro paredes que aquele lugar havia se tornado seu segundo lar, sua maior fortaleza. Ele não era casado, tão pouco tinha filhos, e às vezes ele passava semanas ali. Seja lá para onde estivesse indo, sentiria saudade da sala número 219 da sede do Governo Mágico.

- Alguma última palavra? – indagou Kricolas.

Fazendo um esforço enorme, Mardo cuspiu no rosto do vampiro e disse:

- Vida longa a Kal Foster!

- Veremos. Boa noite ministro.

Como nunca antes, Mardo gritou, era pura dor e agonia, para sua sorte aquilo não durara mais do que cinco segundos. A sala foi impregnada por um forte odor de carne e sangue e Kricolas parecia sentir-se imensamente satisfeito.

- Você foi um tolo em não me contar a localização dos Foster. Bem, há outras pessoas com quem posso me informar. Os Scheiffer, por exemplo...

Enquanto olhava pela última vez o que fizera a Mardo, Kricolas ouviu passos vagarosos vindos do corredor do lado de fora da sala. Ele espiou por entre a porta e viu um vulto se aproximando cada vez mais rápido. Imediatamente, Kricolas se pôs em posição de ataque e assim que o vulto ficou a um metro da entrada da sala, ele abriu a porta e agarrou-o pelo pescoço.

- Não, por favor! – disse o homem – Estive procurando o senhor.

- Todos estão!

- Tenho um interesse em especial, senhor, meu nome é Dorian.

- Me dê um bom motivo para não fazer o mesmo que fiz com Mardo.

Dorian Gulemarc olhou horrorizado para o que deveria ser o corpo do Ministro da Defesa e Segurança Mágica, então voltou-se até o meio vampiro a sua frente e disse:

- Eu sei onde estão os Foster.